Pierre Fédida

(1934 – 2002)

Filósofo, psicólogo e psicanalista, Pierre Fédida é considerado um dos mais importantes nomes da psicanálise francesa e com notável influência na psicanálise praticada no Brasil.

Nasceu em Lyon, em 30 de outubro de 1934, de uma família de origem modesta. O pai judeu de origem argelina era marceneiro e a mãe tecia vestes sacerdotais. Em sua cidade natal Fédida fez parte de sua formação universitária. Foi estudante de Gilles Deleuze e Clermont-Ferrand e formou-se em fenomenologia. Defendeu sua tese de doutorado em letras e ciências humanas, orientando-se depois para a psicopatologia.

A atividade clínica e as manifestações psicopatológicas marcaram profundamente o pensamento de Pierre Fédida, com sólido fundamento na obra de Freud e para o qual contribuíram os estudos e a compreensão da técnica e da metapsicologia de Sándor Ferenczi, Melanie Klein, Wilfred Bion e Donald Winnicott.

É relevante o trabalho desenvolvido por Fédida na universidade francesa, onde instituiu um ensino profundo da psicanálise durante 40 anos. Membro da Association Psychanalytique de France (da qual foi presidente em 1988) e professor da Universidade Paris VII, formou centenas de psicanalistas, dirigiu as teses de Maud Mannoni, Patrick Guymard e Monique David-Ménard. Foi co-diretor da coleção “Forum Diderot”, das Presses Universitaires de France (PUF), que de 1995 a 2002 publicou intervenções feitas por filósofos, cientistas, juristas e outros participantes durante colóquios organizados pela Paris VII – Denis Diderot e Associação Diderot, presidida pelo filósofo Dominique Lecourt.

Em necrológio para o jornal Le Monde de 6 de novembro de 2002i, publicado por ocasião da morte de Fédida, a psicanalista Elisabeth Roudinesco relembra que, percorrendo a trilha de Daniel Lagache, Didier Anzieu e Jean Laplanche, Fédida considerava que o ensino da disciplina freudiana não deveria ser uma exclusividade das associações psicanalíticas. Precisaria, sim, confrontar-se com outros domínios do saber. Sua posição levou-o a inovar o ensino nos departamentos de psicologia clínica após tornar-se professor da Universidade de Paris VII, em 1979. Ali, estabeleceu um “verdadeiro diálogo, de um lado, com os freudianos de obediência lacaniana, e, de outro, com os outros universitários, permitindo assim que a universidade se tornasse um lugar de confrontação entre as diversas correntes freudianas e entre elas e as outras disciplinas”.

Sobre a inserção da psicanálise na universidade, Fédida afirma, em entrevista a Alain Braconnier (publicada originalmente em Le CarnetPSY, em fevereiro de 1999)ii, que a presença na universidade permitiu um reforço no desenvolvimento da psicanálise e está entrando para a história do movimento psicanalítico. No entanto, continua ele, “é preciso atentar naquilo que de um modo ou de outro busca progressivamente tirar a psicanálise da universidade. A pergunta que se faz é a seguinte: a psicanálise continuará a ter o lugar que tem na universidade?”

Fédida é autor de vasta obra escrita, em que mescla estudos sobre literatura, arte e outros temas. Seu trabalho é internacionalmente reconhecido. Uma das questões clínicas que ganharam maior destaque na obra do filósofo e psicanalista é a contratransferência, a respeito da qual escreveu vários trabalhos.

Na descrição de Roudinesco, em Crise et contre-transfert (PUF, 1992), Fédida analisou a origem da contratransferência na perspectiva de abrir a psicanálise para outros campos de investigação. Continuou sua reflexão em O sítio do estrangeiro (PUF, 1995/Escuta, 1996), em que trata da posição do analista, capaz de circunscrever uma ausência que favorece o avanço positivo do tratamento. A psicanalista cita ainda o último livro de Fédida, Les bienfaits de la dépression (Odile Jacob, 2001/Escuta, 2002), no qual o autor elucida o sintoma da depressão para deduzir que “este impede o sujeito de entrar na melancolia, o que traz um benefício que os adeptos do tratamento químico se enganam ao querer extirpar” (conforme artigo publicado no jornal Le Monde de 9 de fevereiro de 2001).

Obras

  • Dicionário sumário, comparativo e crítico das noções principais da psicanálise, Paris: Larousse, 1974. Collection: Les Dictionnaires de l’homme du XX×10 século.
  • O conceito e a violência, Paris: Union générale d’éditions, 1977.
  • Corpo do vazio e espaço da sessão, Paris: J.-P. Delarge, 1977.
  • A ausência, Paris: Gallimard, 1978. Collection: Collection Connaissance de l’inconscient.
  • Crise e contratransferência, Paris: Presses universitaires de France, 1992.
  • O sítio do estrangeiro – a situação psicanalítica, Paris: Presses universitaires de France, 1995.
  • Por onde começa o corpo humano: retorno à regressão, Paris: Presses universitaires de France, 2000.
  • A farsa da neuropsicanálise, artigo publicado na La recherche hors, série n3 (abril/2000).
  • Os benefícios da depressão: elogio da psicoterapia, Paris: Odile Jacob, 2001.
  • Psiquiatria e existência: textos reunidos por Pierre Fédida, Jacques Schotte, Jerôme Millon, Collection Krisis, 1991.

Estes livros estão traduzidos em diversas línguas. Em português, estão publicados:

  • Clínica psicanalítica: estudos, São Paulo: Escuta, 1988.
  • Nome, figura e memória – A linguagem na situação psicanalítica, São Paulo: Escuta, 1988.
  • O sítio do estrangeiro – a situação psicanalítica, São Paulo: Escuta, 1996.
  • Depressão, São Paulo: Escuta, 1999.
  • Os benefícios da depressão: elogio da psicoterapia, São Paulo: Escuta, 2002.

Resenha elaborada por Cláudia Aparecida Carneiro, membro da Sociedade de Psicanálise de Brasília.