…….Nossos filhos não são nossos filhos,
São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma,
Vêm através de nós, mas não de nós,
E embora vivam conosco, não nos pertencem.
Podemos outorgar-lhes nosso amor, mas não nossos pensamentos,
Podemos abrigar seus corpos, mas não suas almas;
Podemos esforçar-nos para sermos como eles, mas não podemos fazê-los como nós.
…….Somos os arcos dos quais nossos filhos são arremessados como flechas vivas,
Que nosso encurvamento nas mãos do arqueiro, seja nossa alegria.
(Khalil Gibran)
Castigo Funciona?
Edna Maria Romano Wallbach
Há uma enorme diferença entre adquirir disciplina por identificação àqueles a quem se ama, e tê-la imposta autoritariamente. O que as crianças aprendem com o castigo severo, é que o poder faz a justiça e quando forem grandes e fortes o suficiente, tentarão compensar suas mágoas punindo os pais, agindo de maneira a desgostá-los.
Cada criança reage de maneira diferente aos castigos impostos, dependendo de sua personalidade e, sobretudo da natureza de sua relação com os pais, mas não há criança que punida muito severamente, escape ao sentimento de humilhação. Pode aprender a esconder suas atitudes e quanto mais severo o castigo, mais dissimulada ela poderá se tornar.
É comum que os pais tenham dificuldade em ver o filho como uma pessoa separada, com sua personalidade própria, características próprias, por mais parecido que seja física ou no aspecto de temperamento, com o pai ou com a mãe. O filho é ele próprio, com suas características, e é preciso respeitá-lo acima de tudo. Filho não é posse dos pais, assim como também não é boletim dos pais. Há muitas vezes um desejo que até pode ser inconsciente, de que os filhos espelhem as qualidades dos pais, assim como pode também haver um desagrado muito grande pelos defeitos que se repetem. É importante ressaltar que muitas vezes é provável que vá existir conflito, uma vez que, inevitavelmente os pais frustrarão seus filhos em algum momento. Os pais têm que ajudar a criança a lidar com perdas e com uma realidade limitada.
Mas o que fazer com crianças muito pequenas, que ainda não são capazes de compreender uma conversa e que agem muito mais movidas por instintos? Às vezes os pais precisam colocar limites, segurando-a ou tirando-a de perto, para que pare de mexer na bolsa da mamãe, ou puxar o rabo do cachorro. O que não é certo é deixar a sala vazia de enfeites, por exemplo, quando se tem crianças pequenas. Muitas vezes frustrar uma criança pode ser um ato de amor. Mais tarde ela terá que saber enfrentar as frustrações que a vida civilizada impõe! Uma criança sabe quando o castigo é justo e isto pode provocar raiva na hora, mas não provoca rancor.
Todos sentimos raiva, e é importante que possamos suportar as manifestações de raiva dos nossos filhos. Isso não quer dizer que possa quebrar coisas ou dar chutes, mas que fique brava é muito natural. Assim como os pais também podem ficar bravos e ter raiva da criança que não está obedecendo. Mais tarde quando a criança já está maior, e faz algo que desagrada os pais, manda-la pensar no quarto durante alguns minutos (variando esses minutos dependendo da idade da criança), pode ser uma atitude muito amorosa. A criança vai ficar sozinha, triste, e mais tarde o pai, ou a mãe, deverá ir lá para saber o que foi que ela pensou. Aí então, talvez até haja condições de se ter uma conversa.
A criança vai aos poucos se identificando e internalizando os valores dos pais, uma vez que a melhor maneira de ser amado por eles é fazer o que eles aprovam. A única disciplina efetiva é a autodisciplina, motivada pelo desejo interior de agir de maneira a ser agradável aos pais. Se na relação da criança com seus pais, prevalece o amor, ela vai querer viver em certa harmonia com eles o que mais tarde vai corresponder a ficar bem a seus próprios olhos, de acordo com seus próprios valores, de maneira a sentir-se bem consigo mesmo – ter uma “boa consciência”. Isso se fundamenta em valores que internalizamos porque amamos, admiramos e desejamos ser amados por essas pessoas que significam tanto para nós.
Quando uma criança é freqüentemente agredida e desrespeitada, ela pode aprender a responder na mesma medida, e como ela não pode bater nos próprios pais, porque é mais fraca, ela vai fazer tudo para desagradá-los, e isso criará dentro dela mesma, uma auto- imagem de que ela é má, que ela tem algo de errado e que não merece ser amada. Isso vai se tornar um círculo vicioso, que resultará num profundo ferimento da auto estima.
É importante que os pais possam tratar os erros dos filhos, como o que realmente são, e não como catástrofes. A criança pode ter feito uma coisa realmente muito errada, mas isso não significa que ela é errada. Existe uma diferença! Se eu digo: “Isso que você fez, meu filho, é uma besteira, por isso e por aquilo, etc.”; é diferente de dizer: ”- Você é um idiota”.
Essas coisas são muito complexas, porque um pai que se sente um “idiota”, ou seja, que tem, ele mesmo, uma auto-estima muito rebaixada, pode projetar todo esse seu sentimento de desvalia no próprio filho, produto seu, e então o filho também não vai prestar a seus olhos. Esse sentimento do pai é dia por dia assimilado pelo filho que também vai se sentir muito desvalorizado.
Um pai que foi educado muito severamente pode ou fazer o mesmo com o filho, numa espécie de vingança, ou então pode ocorrer uma outra coisa tão prejudicial quanto, que é o pai dar tudo o que não pode ter a seu filho e vingar-se por assim dizer do próprio pai, projetando-se no filho e super mimando a criança tornando-a incapaz de se frustrar.
Estamos falando da qualidade da relação entre pais e filhos. Os pais devem olhar para dentro de si e se questionarem se estão orgulhosos de si mesmos, pois isso os tornará capazes de amar seus filhos respeitando tanto seus sucessos como também suas dificuldades.
Não é só a consciência que nos diz para não agir errado porque podemos ser castigados. A consciência efetiva nos motiva a agir certo, porque sabemos que de outra forma sofreremos toda a dor, tristeza e remorso de nos sentirmos mal com nossos próprios valores.
Apesar de nossos sentimentos interiores serem o que há de mais importante nesse aspecto, existem também alguns ingredientes externos que apóiam nossa capacidade de nos respeitar. Ou seja: o desejo de ganhar e preservar a estima de outras pessoas cuja opinião valorizamos. Se não damos valor à visão positiva que têm de nós, então o que pensam não terá a mínima importância. Assim, o objetivo dos pais, deve ser o de fortalecer o amor próprio de uma criança e torná-lo tão forte e relevante que impedirá pela vida toda, que o jovem aja erradamente.
A voz da razão precisa ser cuidadosamente cultivada e mostrada de maneira atraente para as crianças, de maneira que possa ser ouvida. Não é gritando que a criança vai ouvir. Nossa tarefa é criar uma situação em que a razão possa ser ouvida com voz macia e considerada com atenção.
É muito vantajoso para todos pensar que quando se está irritado, não se raciocina. É claro que todos os pais, ficam por vezes irritados com os filhos. Muitas vezes deixar para conversar depois que a emoção do momento já tenha passado, pode ser uma solução, quando se vai perder a cabeça.
Não é fácil escrever um artigo sobre castigo, e também é importante saber que o que importa é que os pais sejam suficientemente bons, sabendo que ninguém é perfeito e que muitas vezes os pais também não são capazes de controlar seus sentimentos inconscientes. Por isso, quando esta tarefa está muito difícil, é preciso pedir ajuda a um profissional que poderá ver com mais neutralidade toda a situação e esclarecer o que for preciso.
Um trabalho de orientação de pais às vezes pode ser útil para evitar que a criança apresente problemas mais tarde.